quarta-feira, 17 de setembro de 2014

O abajur de Luzia

Luzia mora com os avós. A menina tem um quarto só para ela, mas não gostava de dormir sozinha, porque sentia medo e ficava a noite toda chamando por eles. Seu avô e sua avó até lhe diziam que não havia motivo para ter medo, mas não adiantava muito. Luzia continuava inquieta e acabava não dormindo direito.
 
Na manhã seguinte a uma dessas vezes, o avô de Luzia acordou bem cedo e foi até o porão. Lá, levantou a tampa do baú de madeira antigo, revirou as tralhas que guardava ali dentro e de lá tirou um abajur empoeirado. Passou um pano úmido no abajur, que agora já nem parecia tão velho. Depois, ficou horas trabalhando no conserto do objeto, que há tempos estava sem funcionar. Por fim, ele enfeitou o abajur com adesivos coloridos, que combinaram perfeitamente com a decoração do quarto da menina.

Na hora de dormir, Luzia e os avós foram até o quarto dela. Seu avô disse “faça-se a luz!” e ligou o abajur na tomada. Funcionou! Feito mágica, o abajur iluminou todo o quarto. Os olhos da menina brilhavam fascinados com a luz que irradiava da pequena lâmpada colorida. Com o abajur ligado, ela viu espalhadas pelo teto pequenas estrelas feitas de papel recortado. Era mais um agrado de sua avó. Naquela noite, Luzia dormiu com um largo sorriso nos lábios.

Quando acordou, a primeira coisa que fez foi correr na direção dos avós para abraçá-los. 

– Vó, eu nem senti medo! – disse a menina. 

A avó fez um cafuné em Luzia e respondeu: 

– Eu vi, minha filha. Parabéns! Estou muito orgulhosa de você.


* O conto ‘O abajur de Luzia’, 6º colocado no 3º Desafio Literário Farol Fantástico, foi selecionado para publicação na revista Farol Fantástico - revista eletrônica de publicação trimestral voltada exclusivamente para a literatura infanto-juvenil.

terça-feira, 16 de setembro de 2014

A multiplicação dos pães partidos

Depois de um dia intenso de trabalho, Emanuel e seus amigos atravessaram a ponte de bicicleta, distanciando-se da cidade, em busca de um lugar deserto para descansar. Chegando lá, no ponto mais alto, de onde era possível ver todo o povoado, perceberam que não estavam sós. Emanuel viu nos olhos da multidão o cansaço por levar a vida que levavam e teve compaixão daquele povo.
Alguns amigos de Emanuel lhe disseram que deveriam rezar para que aquelas pessoas mudassem de vida. Elas, que trabalhavam duro, de sol a sol, para receber um dinheiro pingado, que mal dava para sustentar tantas bocas em casa, que, de segunda a segunda, andavam de lá para cá, pela cidade, dentro de ônibus lotados, e que, depois disso tudo, só queriam saber de assistir à novela e dormir, para, como sempre, acordar bem cedo no outro dia.
Um amigo sugeriu que arrecadassem comida para doar àquela gente faminta, mas Emanuel fez diferente, porque sabia que isso não mataria a fome do povo. Emanuel perguntou a eles o que tinham e recebeu como resposta: “muita fome, pouco pão e muitos braços.” Sem contar inutilidades como promessas não cumpridas, um lado de uma sandália, chaveiros, camisas de candidatos e botons.
Emanuel, então, orientou o povo a se reunir em grupos, alguns menores, outros maiores, e que, nesses grupos, tudo fosse partilhado. E assim fizeram. Eles tinham tudo em comum: comida, bebida, suas dores e angústias, e sonhos, muitos sonhos de uma vida melhor.
Foi então que perceberam que juntos poderiam acabar com aquilo que lhes causava fome. Decidiram não confiar em quem só lhes dava cesta básica a cada quatro anos. O tempo passou e a vida deles mudou da água para o vinho. Milagre? Não, não foi milagre. Eles apenas resolveram colocar a mão na massa, em vez de esperar que o pão nosso de cada dia caísse do céu. Não só fizeram questão de decidir os nomes de quem estaria à frente do lugar, como passaram a participar ativa e cotidianamente das decisões sobre o que era melhor para o pedaço de chão em que pisavam.
No lugar de expressões de cansaço, apareceram sorrisos e esperança. E no lugar da fome, trabalho digno, crianças na escola, filhos na universidade. Mas nada aconteceu de um dia para o outro. E é por isso que até hoje eles seguem as palavras de Emanuel.

* O conto ‘A multiplicação dos pães partidos’ foi publicado na revista Pacheco.

domingo, 7 de setembro de 2014

Êxodo


* O poema ‘Êxodo’ foi selecionado para publicação no Livro da Tribo, da Editora da Tribo e nas revistas Semeadura (ed. trimestre I – 2017) e LiteraLivre (7ª ed.), e pelo projeto Folhinha Poética 2015. Foi ainda selecionado em 2016 pelo projeto Declame para Drummond.